Os anos 70 começam quando terminam os anos 60. E isto pode ter sido em maio de 68, em Paris, durante a primavera de Praga, ou quem sabe, em agosto de 69, em Woodstock, quando Jimmy Hendrix mesclou o hino dos EUA com o som das bombas que explodiam no Vietnã.Mas podemos afirmar com certeza que quando Lennon disse "O Sonho Acabou" (em 1970, com a dissolução dos Beatles), já estávamos nos anos 70. Assim, podemos combinar, cá entre nós, que a década começou no momento em que perdeu-se a inocência e a crença nos ícones e bandeiras dos 60.
Este foi um processo lento. Colaboraram para ele o assassinato da atriz Sharon Tate por um grupo de fanáticos liderado por Charles Manson em 1969, as mortes de Jimmy Hendrix e Janis Joplin em 1970, de Jim Morrison em 1971 e até a chegada solitária do homem à Lua em 1969, imagem célebre que coroou não só o fim de uma década mas, principalmente, o início de outra.
Os Novos Baianos compunham, tocavam e conviviam no mais completo espírito "paz e amor" dos 70. |
David Bowie na capa do disco "Aladdin Sane", de 1973, que, junto com "Ziggy Stardust" (1972), fez o ápice de sua fase glitter. |
No início dos anos 70, surgiu a onda glitter: a nova moda futurista, andrógina, metálica e espacial sintetizada na figura camaleônica do roqueiro David Bowie.O hedonismo dos festivais de rock ao ar livre, a celebração da vida alternativa, do amor livre, das drogas, do "flower power", foi cedendo espaço para a individualização, para o culto ao prazer e para o sexo casual em espaços fechados - as discotecas.
Neste momento, Andy Wahrol proclama: "no futuro todos serão famosos por 15 minutos". Assim, cada um de nós, simples mortais, começamos a correr atrás dos nossos 15 minutos, "travolteando" nos embalos de sábado à noite.
Cena clássica do filme "Embalos de Sábado à Noite" (1978), com John Travolta arrepiando nas pistas ao som dos Bee Gees. |
O punk foi simultaneamente a resposta à frivolidade disco, à ingenuidade hippie e ao rebuscamento do rock progressivo.
O punk foi simultaneamente a resposta à frivolidade disco, à ingenuidade hippie e ao rebuscamento do rock progressivo.
À dúvida dos anos 70, herdada dos 60, "ficar à margem do sistema ou integrar-se ao sistema", os punks responderam: nem uma coisa nem outra. A nova proposta era destruir o sistema, substituindo a velha ordem hipócrita, injusta e desigual por uma sociedade mais verdadeira e honesta.Não é por acaso que o movimento eclodiu em bairros operários dos subúrbios da Inglaterra. Era lá que a crise econômica estava mais brava e era lá também que a mentalidade pequeno-burguesa era mais conservadora.
A banda punk inglesa Sex Pistols em cena do documentário "O Lixo e a Fúria" (1999), de Julien Temple, testemunha ocular da história. |
E assim, para concluir, qual foi afinal, o legado dos anos 70? Talvez seja luta pela liberdade de expressão em todas as suas dimensões. A luta pelo fim da censura, pela igualdade de condições e oportunidades para homens e mulheres, pela liberdade de opção sexual, liberdade para criar sua própria moda com o "faça você mesmo", liberdade para dançar como quiser - "dance bem, dance mal, dance sem parar"...
Até hoje, a década é uma referência para os criadores de moda, que se inspiram nas múltiplas tendências dos anos 70: hippie, glitter, disco, punk e até a moda engajada, que, ironicamente, chegou a adotar o estilo militar nas roupas.
Por isso, para o Brasil pelo menos, talvez os anos 70 não tenham terminado em 1979, mas um pouco depois, com a luta pela abertura política, com a luta pelas "Diretas Já" em 1984, com o amadurecimento de uma produção cultural de peso no cinema, na música, na televisão, ou até mesmo, em 1982, com a derrota da Seleção Brasileira na Copa, doze anos depois da conquista do tri.
E hoje, mais de trinta anos depois do "Concerto para Bangladesh" [primeiro show beneficente do rock feito em prol dos refugiados de Bangladesh e idealizado pelo ex-beatle George Harrison] assistimos a inúmeras iniciativas semelhantes, o amadurecimento das ONGs (Organizações Não Governamentais) e o surgimento de uma mentalidade mais solidária, provando que foi possível conservar o legado idealista da década de 60 através dos conturbados anos do fim do século 20 até estes não menos confusos primeiros dias do século 21.
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